terça-feira, 17 de julho de 2007

Carta aos adoradores da Big Pharma

Reproduzo abaixo, texto de José Aristodemo Pinotti publicado hoje, na Folha de S.Paulo denominado Bravata ou patriotismo? Em negrito, destaco as informações que são desconhecidas por muitos e escondidas por poucos. As discussões sobre quebra de patentes não foram ainda aprofundadas de forma suficiente e fugiram do noticiário. Retomo o assunto. O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, em artigo nesta mesma seção ("Tendências/Debates", dia 27/5), mostra a dimensão dessa afirmação, ao dizer: "As indústrias [farmacêuticas nacionais] perderam competitividade internacional ao longo da década de 90". Mas o mercado farmacêutico, que, no começo dessa década, movimentava R$ 4 bilhões, hoje movimenta R$ 22 bilhões, gerando lucros e empregos, predominantemente, para as indústrias sediadas fora do país. Voltemos a 1996 (nada é mais distante que o passado recente). Vemos um Congresso Nacional desinformado e submisso às pressões para aprovar a lei das patentes com três salvaguardas que teriam prevenido não só o atual licenciamento compulsório como também a derrocada da indústria farmoquímica brasileira. Naquela ocasião, tínhamos cerca de 50 fábricas. Hoje, restam menos de 20. A Índia, de quem vamos comprar o Efavirenz, tem mais de mil. As salvaguardas -discutidas, combinadas e depois derrubadas no plenário- eram: 1) "interregno", ou seja, aprovada a lei, teríamos cinco anos para ela entrar em vigor, o que valia dizer: indústria farmoquímica brasileira, aprimore-se e se prepare para a concorrência internacional; 2) "fabricação local" -reconheceríamos as patentes dos medicamentos fabricados aqui, ou seja, estaríamos atendendo o apelo da "propriedade intelectual industrial" e o fim da "pirataria" (se é que ela existia), mas importando ciência e tecnologia abertas, democratizando-as, dando empregos e desenvolvendo o país; 3) "permissão especial aos laboratórios públicos", como a Furp (Fundação para o Remédio Popular) e outras, para fabricarem, sem as proibições patentárias, por um período de dez anos, os medicamentos que seriam distribuídos gratuitamente pelo sistema público de saúde, com economia de recursos e impacto sobre a saúde pública. As duas primeiras salvaguardas eram, inclusive, recomendadas pelo Trips (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), que regula internacionalmente o direito de propriedade intelectual. Faltou coragem, patriotismo, seriedade e independência ao Congresso Nacional, e lembro-me de que, no dia seguinte à aprovação da lei (sem as salvaguardas), o então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, festejou a criação de 60 mil novos empregos no seu país. Onze anos depois, o que vemos por aqui: aumento contínuo no preço dos medicamentos, falência da indústria farmoquímica e a necessidade de agir no varejo, ameaçando uma patente ali, quebrando outra aqui. O Congresso Nacional tem todas as condições e o poder para se redimir, revendo a lei das patentes, o que seria, aí sim, uma manifestação de coragem e patriotismo. Existem lá dois projetos de lei (nº 230 e nº 303, de 2003) de minha autoria. É só fazê-los andar -foram bloqueados pelos mesmos interesses anteriores. Para mostrar que é possível quando existe vontade política, é bom lembrar o que aconteceu com os "genéricos". Depois de conseguirmos desengavetar e colocar o projeto, em caráter de urgência, para ser votado, o então ministro da Saúde, José Serra, com suporte do presidente à época, Fernando Henrique Cardoso, fez dele uma realidade que resultou em menor custo dos medicamentos, geração de empregos e riqueza para o país. Aí está a diferença entre uma bravata, convenhamos, necessária, e uma medida patriótica que desenvolve o país sem afetar a globalização, o capitalismo ou como quiserem nominar esse conjunto de interesses que dominam o mundo contemporâneo. Na verdade, sem fugir muito das regras, é possível proteger o país, como o ex-presidente Clinton fez para os Estados Unidos, em detrimento do nosso. Para isso existem Congresso, governo e democracia

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